por Yalorixá Diana de Oxum
Este mês, mesmo com a cidade de Salvador entusiasmada com o início da Copa do Mundo 2014, com a abertura das Festas Juninas e a escolha dos pré- candidatos ao Governo de nosso Estado, eu fiquei a me perguntar: “Onde moram as nossas esperanças como povo negro?”.
Em meio as minhas atividades como vice- presidente do conselho Municipal de Comunidades Negras de Salvador , durante uma exibição pública de um vídeo – Navio Negreiro - do Projeto Mostra Criativa 2014 da Secretaria Municipal de Educação (SMED) , deu um “ estalo” na minha cabeça e me fez surgir várias “ dores” e dúvidas na minha cabeça como Yalorixá:
Quantos de nós, negros e negras, ainda somos “jogados ao mar” do esquecimento e não mais “ ao mar dos navios negreiros” do passado ?
Quantos de nós, negros e negras, vemos nossas esposas serem jogadas “ao mar da morte” junto com nossos filhos nos atendimentos públicos de saúde pela Bahia?
Quantos de nós ,negros e negras, somos “ expostos” à violência moral , psicológica e física semelhantes as “ chicotadas e açoites” do passado ?
Quantos de nós , negros e negras, somos “ escolhidos” para estar no mercado de trabalho semelhante às metas de nossos “ feitores e senhores da casa grande” ?
Lembrando-me das expectativas do passado em sermos um país democrático, visitei em minha memória os locais onde, ainda hoje, meus irmãos de cor e crença são obrigados a “ sobreviver” . Ruas sujas, sem esgotamento, sem calçamento, com escolas “ assombradas” pelo medo da violência e com profissionais de educação “ deprimidos” e mau remunerados . Qual a diferença entre esta realidade propagada na TV e aquela realidade brutal na travessia de nossos irmãos negros nos navios clandestinos espalhados e atracados pelo mundo, naquela época?
Ao longo de meus anos de vida no axé e militância como mulher negra professora, fico a me perguntar o que nossos irmãos de cor tem feito quando alcançam “ o poder” municipal , estadual e federal ? Não digo aqui que é um erro ter um negro no poder . Eu seria leviana e injusta. Me pergunto quais negros estamos colocando no poder.
Acompanho os projetos de lei , os planos nacionais , estaduais e municipais ( saúde , educação e moradia para o povo de terreiro ) , os editais para projetos e vejo quanto “ os açoites” do presente são silenciosos e perigosos nas linhas da burocracia que vivemos .
O que nossas crianças, jovens e mães podem esperar de um “ assistencialismo escravo” que foi imposto em nossas comunidades periféricas e , por isso , os fazem calar seus direitos ?!
Nos mercados antigos a beira mar , para se escolher um bom “ escravo trabalhador” e uma boa “ negra parideira” é a sua pele vistosa e as condições de seus dentes . Hoje, isso nada se diferencia das doutrinas políticas estéticas para se escolher qual negro ou negra deverá nos representar no poder . Nossos símbolos religiosos espirituais são cada vez mais avacalhados em propagandas políticas em busca de votos e pré candidatos com ou sem experiência no meio político , fazem a nossa face “arder” de dor pelos escândalos políticos , garfes públicas e exonerações assim como as costas acoitadas de nossos irmãos negros na época dos antigos pelourinhos .
Peço aos meus filhos de santo, amigos e irmãos de axé muito cuidado neste ano eleitoral. “ Os feitores” do nosso passado eram negros e nem por isso deixaram de nos açoitar . Estamos nos “ açoitando” a séculos e não queremos encarar esta realidade . Os mesmos “ panos quentes” que cicatrizavam as marcas da violência sofrida por nossos irmãos guerreiros que construíram nossa história de luta racial , são os mesmos “ panos quentes” que são colocados na divulgação e promoção de candidatos já conhecidos e pré candidatos negros sem o mínimo de ética política na construção real da igualdade racial em nosso convívio até hoje .
O voto é uma “arma” que poucos estão acertando o alvo real: a cidadania digna.
Yalorixá Diana de Oxum
Presidente da Associação de Terreiros da Liberdade e Adjacências - Egbé Axé
Vice-presidente do Conselho Municipal de Comunidades Negras ( CMCN) Biênio 2014/2016
(71) 3386-9780 / 8740-6436
Facebook: https://www.facebook.com/egbe.axe?fref=ts
Blog: www.associacaoegbeaxe.blogspot.com
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