segunda-feira, 15 de março de 2010

Juca se licencia do PV

Decepcionado com alianças que considera conservadoras, ministro da Cultura, Juca Ferreira, se afasta do PV
Diante de divergências com a cúpula do Partido Verde, o ministro da Cultura, Juca Ferreira, comunicou sua licença da legenda por um ano. Dirigentes do partido pressionavam o ministro a deixar o cargo e apoiar a candidatura à Presidência da senadora Marina Silva (PV-AC). Pouco antes de uma amiga entregar a carta ao partido, o ministro telefonou para o vereador carioca Alfredo Sirkis, coordenador da campanha de Marina, e adiantou a decisão. “Sendo realista, não temos mais condições de manter isso. Eu vou suspender minha filiação por um ano e seja o que Deus quiser”, afirmou o ministro ao colega.

Membro do PV há 22 anos, o sociólogo critica a opção “conservadora” do partido em firmar alianças estaduais com o PSDB e DEM. Secretário executivo da Cultura desde o início do governo Lula e titular da pasta há dois anos, Juca tem simpatia pela candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Ao lado do presidente Lula, a pré-candidata do PT prestigiou o ministro ontem, na abertura da II Conferência Nacional de Cultura.

Vereador de Salvador por dois mandatos, Juca defende a reeleição do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT). Em entrevista ao Correio, o ministro criticou a pré-candidatura do deputado federal Luiz Bassuma (PV-BA) ao governo baiano e afirmou que, licenciado provisoriamente do partido, terá maior liberdade para apoiar o governador petista. “Eu agora sou um cidadão-pipoca”, afirmou, em alusão aos foliões que curtem o carnaval baiano sem o abadá dos blocos de rua.

» Agora eu sou um “cidadão-pipoca”

Por que o senhor decidiu suspender sua filiação ao PV?
Venho divergindo do partido há quatro anos. O partido virou pragmático, com alianças preferencialmente com a direita e agora, quando a Marina chegou, imaginei que a gente viveria um processo de renovação programática. Tive conversas com ela, com Alfr edo Sirkis e apelei para um processo democrático, mas houve uma opção de construir a candidatura de Marina como um projeto conservador, com alianças pela direita. A gota d’água foi que a (direção) nacional está impondo na Bahia a candidatura de Luiz Bassuma, deputado que era até recentemente do PT e uma pessoa que não respeita o caráter laico do Estado. É contra os direitos que as mulheres conquistaram, particularmente o direito de discernir sobre o próprio corpo, é contra política de saúde pública para atender as mulheres que interromperam gravidez e contra os direitos dos homossexuais. Eu não me sinto identificado com ele, com essa candidatura.

O senhor se opõe à candidatura da senadora Marina Silva por fazer parte do governo Lula?
Não, por isso não. O PV tem direito a ter uma candidatura própria e a ex-ministra é uma pessoa decente, íntegra, que tem uma carga simbólica grande com a questão ambiental. Não tenho problema com isso. Estive com ela logo depois da filiação (em agosto) e falei: “meu problema não é nem seu nome, nem sua candidatura. Meu problema são as alianças”. Essa candidatura está sendo construída como uma candidatura de oposição, como uma linha auxiliar à candidatura do José Serra (do PSDB). E eu não me sinto confortável. Estão botando a candidatura no colo da oposição. Eu acho isso um erro histórico. A aliança no Rio e em São Paulo é com o DEM e com o PSDB e já declararam apoio ao PSDB de Minas Gerais. Se a maioria do PV optasse ir para a oposição, eu acataria. Se houvesse um processo democrático —, mas não houve. Tenho 22 anos de militância no PV. Acho que um pouco de respeito não faria mal.

O senhor pretende apoiar candidaturas do PV nos estados?
Quem já se separou sabe que tem um momento que os psicanalistas chamam de luto. Eu vou processar a separação. Tenho amigos lá, pessoas que respeito. É uma atitude que estou tomando reagindo a um processo determinado. Preciso processar isso, até para minha saúde mental. Estou nessa primeira fase, vivenciando a separação. Agora sou um cidadão-pipoca. No carnaval da Bahia, o folião que brinca fora das agremiações é chamado de folião-pipoca, que é a maioria. Eu estou me associando à maioria dos cidadãos brasileiros. Vou vivenciar e buscar descobrir o que significa isso, e vou fazer minhas opções a partir da minha consciência e do meu desejo.

O senhor vai participar da campanha da ministra Dilma Rousseff ?
É possível, mas cedo. O governo Lula é um governo importante na história do Brasil. O presidente deu uma contribuição para a sociedade associando desenvolvimento à inclusão de milhões de brasileiros. Isso acena com a superação de uma mazela histórica. E a ministra Dilma representa continuidade. Eu tenho simpatias pela continuidade do governo porque acho este gove rno historicamente importantíssimo e que pode ajudar a nos empurrar para um outro patamar histórico, de uma sociedade mais igual, mais justa. E trabalharei para contribuir, para ampliar os critérios de sustentabilidade desse desenvolvimento.

O que o senhor pretende fazer após o ano de licença?
Eu não tenho essa ansiedade de saber o que estarei pensando daqui a um ano. É possível que eu queira voltar ao PV, é possível que não. É possível que o PV me queira de volta, é possível que a ruptura tenha sido profunda. Não vou especular sobre isso hoje. Vou exercitar a minha condição de cidadão-pipoca, desfrutar dessa condição com o máximo de liberdade. Vou procurar manter minha coerência e viver o aqui e agora político.

Por Flávia Foreque

Enviado por Antonio Galhardo

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