A Praça da Sé, diante da Catedral Metropolitana de Fortaleza, recebeu na manhã de ontem todas as cores e ritmos de grupos de afoxé em homenagem à libertação dos escravos na Capital, há 128 anos.
Em 24 de maio de 1883, o local foi o ponto de partida do cortejo que celebrou a abolição da escravatura na cidade, e seguiu até o Passeio Público, passando pelo Forte de Nossa Senhora da Assunção em agradecimento ao 26º Batalhão de Voluntários da Pátria, engajados na causa abolicionista.
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| Grupos folclóricos se apresentaram ontem no evento Fortaleza Liberta (IGOR DE MELO) |
Com o objetivo de rememorar a importância do fato histórico, o evento Fortaleza Liberta convidou a população a realizar esse mesmo percurso, dando início a uma série de atividades comemorativas.
De acordo com o idealizador do projeto, Ivaldo Paixão, presidente nacional do Movimento Negro do Partido Democrático Trabalhista (PDT), a ideia é inserir o evento no calendário cultural de Fortaleza e perpetuar a memória coletiva.
“É necessário que as pessoas entendam a importância de não deixarmos a história cair no esquecimento. Devemos nos orgulhar, pois o Ceará foi a primeira província a acabar com o grande flagelo da escravatura. Ao mesmo tempo, Fortaleza deu o exemplo para as demais metrópoles, sendo a primeira grande cidade a abolir a escravidão, fato que influenciou até mesmo o 13 de maio de 1888, data em que foi assinada a Lei Áurea”, afirma Paixão.
Cultura
O servidor público Tiago Nascimento, de 26 anos, fez questão de participar da abertura do Fortaleza Liberta, na Praça da Sé, e acompanhou o cortejo de grupos percussivos de tradição afrobrasileira até o Passeio Público. “É fundamental resgatar e valorizar ações que defendam a nossa cultura. Até hoje, ainda temos uma dívida muito grande para com a exploração feita sobre a figura do negro, e nem todo mundo se conscientizou que diferenças de cor não deveriam mais existir. Espero que a sociedade como um todo abrace essa causa”, afirma.
Para o etnomusicólogo Marcello Santos, de 40 anos, coordenador da Caravana Cultural (escola de ritmos afrobrasileiros), a expectativa é de que o evento sensibilize a população e o poder público para a necessidade de reavivar as tradições da cultura afro. “Temos poucas referências à libertação dos escravos em Fortaleza. A rua 24 de Maio, por exemplo, é uma alusão a uma batalha militar no Paraguai, e não à libertação dos cativos”.
Marcello ressalta ainda que, apesar do pioneirismo de Fortaleza em relação à abolição, cidades que tiveram um papel bem menos relevante conseguem manter viva a herança histórica. “Em Mossoró, são realizadas festas durante uma semana inteira para comemorar a abolição. Aqui, ainda temos o estigma. A própria comunidade negra deveria se integrar mais a manifestações que valorizem a nossa tradição. Ela não pode ser perdida”, enfatiza.
O quê
ENTENDA A NOTÍCIA
Atualmente, existem poucos eventos comemorativos que façam alusão à libertação dos escravos. O projeto Fortaleza Liberta espera alertar a população para a necessidade de manter viva a memória da cultura afrobrasileira
SAIBA MAIS
Homenagem
A primeira edição do Fortaleza Liberta ocorreu durante todo o dia de ontem, 24, e homenageou o herói abolicionista Francisco José do Nascimento, o Dragão do Mar.
Oficinas
A programação abrangeu desde oficinas de percussão, dança
e literatura a apresentações de grupos folclóricos. O Baile da Fortaleza Liberta, que encerrou o evento, contou com a presença do Grupo Nossa Voz interpretando músicas do século XIX.
A CIDADÃ
Preconceito A cantora do Afoxé Oxum Odolá reforça a importância do eveto. “Essa comemoração é um reforço contra o preconceito racial. Queremos mostrar que ele existe e que é necessário desconstruí-lo. Ao mesmo tempo, também pretendemos mostrar para a população que as manifestações da cultura afrobrasileira também estão presentes em Fortaleza”.
Adriana de Maria, 31, cantora
Renato Barros de Castro
renatobarros@opovo.com.br

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