quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Mãe Stella faz reflexão sobre visita do papa ao Brasil - Balaio de Ideias: Uma maleta sagrada

Mãe Stella faz reflexão sobre visita do papa ao Brasil. 
Foto: Marco Antonio Teixeira
UOL/Folhapress/22.07.2013

Maria Stella de Azevedo Santos

Eu não podia me furtar de falar da visita do papa Francisco ao Brasil. Reconheço que esse é um tema já bastante notificado pelos meios de comunicação. Não podia ser diferente. Não só é a visita do líder de uma religião que um dia foi a religião oficial de nosso País, mas principalmente pela figura carismática que é o papa Francisco. Para não ser cansativa nem repetitiva, opto por ter como base deste artigo um fato comentado, mas pouco refletido que é a maleta do papa.

Chamo-a de sagrada porque seu conteúdo, com certeza, não é apenas roupas e objetos de primeira necessidade. A maleta do papa é muito maior do que parece ser: todo o acúmulo de experiências em 76 anos de existência é transformado em sabedoria para ser vivida e transmitida, com a singeleza de um coração que tudo faz para se unir a muitos outros corações de boa vontade, para que juntos possam preencher o vazio de muitos outros corações carentes de amor, abraços, esperança, palavras de incentivo e reconhecimento… Enfim, na maleta que o papa carrega com tanto zelo estão guardados tesouros que podem tornar ricos os pobres de espírito.

Creio que quando um sacerdote insiste em orientar os seus fiéis para cuidarem dos pobres não está se referindo apenas a aqueles cujos corpos estão necessitando de comida e cujas casas não têm o necessário para uma sobrevivência digna. “Não só de pão vive o homem”. Há pouco tempo atrás os jovens cantavam: “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte. A gente não quer só comida, a gente quer saída para qualquer parte”. Eles deixavam uma pergunta solta no ar, para ser respondida por cada um de nós como melhor nos conviesse: “Você tem sede de quê? Você tem fome de quê?”

O papa Francisco é transparente como as nascentes das fontes que ainda não foram poluídas e obscurecidas pela inconsequência humana. Como humano que é, o papa Francisco nos pede que rezemos por ele. Tem sede que rezemos uns pelos outros; que cuidemos uns dos outros. Sua alma tem fome e precisa ser alimentada por amor vivido de maneira coletiva.

Os três milhões de católicos, e provavelmente não católicos também reunidos na famosa Praia de Copacabana, foi um importante alimento para a difícil jornada que o ser humano Jorge Mario Bergoglio começa a empreender enquanto representante maior do sagrado na terra, para os fiéis católicos. O sorriso encantado e encantador estampado no rosto do papa Francisco, seus olhos brilhantes de satisfação e seu semblante tranquilo lembravam uma criança que acaba de ser amamentada nos seios de uma mãe afetuosa. E você? “Você tem sede de quê? Você tem fome de quê?”

Nos dias em que fomos agraciados com a presença do papa em nosso País, um fato aparentemente corriqueiro tinha o poder de ao mesmo tempo destoar e harmonizar uma situação: o papa carregava sua própria maleta. Pode parecer para muitos um gesto forçado e midiático de demonstração de humildade. Os corações puros enxergam pureza de gestos e intenções no outro. O referido gesto pode ser analisado por diferentes ângulos.

Como religiosa que sou e sendo o papa também um religioso, optei por analisar esse ato de maneira espiritualista. Segurar sua própria maleta é um gesto que tem voz. Em alto e bom som, ele nos diz: mudei minha posição na hierarquia religiosa da igreja para qual prometi servir como sacerdote, mas não mudei minha essência divina; não mudei meu jeito de ser; não mudei a natureza que a mim foi dada por Deus para cumprir a missão que também a mim foi dada por Ele.

Esse gesto exemplar cochicha em nossos ouvidos para que não permitamos que fatos sociais nos obriguem a abrir mão de valores essenciais, abrir mão dos valores fundamentais para nossa essência. Se o papa Francisco deixar que hoje outras pessoas carreguem para ele sua maleta, corre o risco de que amanhã queiram carregar sua alma repleta de bons sentimentos, pensamentos e intenções. A maleta do papa é sagrada porque ao carregá-la ele nos faz refletir sobre o quão sagrado é o comportamento de respeitar a nossa própria natureza.

Maria Stella de Azevedo Santos é Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá. Quinzenalmente, às quartas-feiras, o jornal A Tarde publica seus artigos.


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