quinta-feira, 2 de março de 2017

Atos de racismo vão levar a multas até 8400 euros e a indemnizações


Indivíduos e empresas podem ser multados por práticas discriminatórias. Valores de coimas estarão indexados ao IAS, para atualização permanente. Previstas indemnizações por danos patrimoniais e não patrimoniais

As práticas de racismo e de discriminação vão ser multadas em valores até 8426,40 euros, segundo uma proposta do Governo que agrava as coimas que já existiam. Mas na iniciativa, que já está em sede de comissão parlamentar para ser dado parecer, o executivo socialista introduz a possibilidade de indemnizar vítimas destes atos.

Segundo o novo regime proposto, “qualquer prática discriminatória por pessoa singular constitui contraordenação punível com coima graduada entre uma e dez vezes o valor do indexante dos apoios sociais” (IAS), ou seja, de 421,32 euros até 4213,20 euros, o que representa um agravamento no valor máximo face ao atual quadro. Se for praticado por uma “pessoa coletiva, pública ou privada”, a coima é “graduada entre quatro e vinte vezes” o valor do IAS, que se traduz em valores de 1685,28 a 8426,40 euros, num significativo agravamento face ao quadro atual. E as pessoas coletivas terão a sua condenação exposta no site do Alto Comissariado para as Migrações.

O gabinete do ministro Adjunto, Eduardo Cabrita, responsável pela proposta, explicou ao DN que o objetivo foi “atualizar os limites mínimo e máximo das coimas, aproximando aos restantes regimes de proteção contra a discriminação” e “garantir um mecanismo de atualização permanente, mediante a respetiva indexação ao IAS” (o valor de referência é o do salário mínimo).

Mais: também “a tentativa e a negligência” deste tipo de atos “são puníveis, sendo os limites mínimo e máximo [das coimas a aplicar] reduzidos para metade”.

Esta prática discriminatória pode dar direito a indemnização aos lesados, “por danos patrimoniais e não patrimoniais, a título de responsabilidade civil extracontratual”. E, no caso da fixação da indemnização por danos não patrimoniais, “o tribunal deve atender ao grau de violação dos interesses em causa, ao poder económico do lesante e às condições do/a lesado/a”.

Também aqui trata-se de “uma uniformização com os restantes regimes de proteção contra a discriminação”, nomeadamente “em razão da deficiência” e “do sexo”, explicou fonte oficial do gabinete.

O Governo justificou a sua proposta – depois de aprovada em Conselho de Ministros a 10 de fevereiro – por permitir “uma intervenção integrada relativamente a todas as formas de discriminação racial”, em “função da raça, cor, nacionalidade e origem étnica e da ascendência ou território de origem”.

Em janeiro, Eduardo Cabrita tinha antecipado esta legislação numa reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, quando questionado pelo BE sobre um relatório da ONU que criticava a ausência de políticas específicas para afrodescendentes, a discriminação de comunidades ciganas, o racismo institucional ou as imagens discriminatórias nos manuais escolares.

Para já, são reforçados os poderes da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial para esta passar multas, que prevê resolver os litígios por mediação e novas formas de discriminação.

Governo afasta quotas raciais

A ONU deixou oito recomendações ao Governo. Para o Comité para a Eliminação da Discriminação Racial, Portugal tem de criar um sistema de quotas que alivie as disparidades e ultrapasse a discriminação. No entanto, o gabinete do ministro Adjunto – que propôs agora quotas para a igualdade de género – notou ao DN que “o Programa do Governo não prevê qualquer medida no sentido da sua implementação”.

O executivo socialista diz-se “disponível para ponderar medidas de ação positiva que sejam necessárias para garantir a concretização efetiva do princípio da não discriminação e da igualdade”, exemplificando com o OPRE – Programa Operacional de Promoção da Educação. Dirigido a estudantes do ensino superior, provenientes das comunidades ciganas e em situação de carência económica, visa travar “o abandono precoce deste ciclo de estudos”.

Reconhecendo que há portugueses que, por “especificidades culturais e sociais”, “merecem uma atenção particular”, o Governo negou que (como defendeu a ONU) os assuntos ligados aos afrodescendentes sejam tratados como questões de imigração. “São questões de coesão social e, eventualmente, de combate à exclusão com base em razões económicas, sociais ou culturais”, respondeu o gabinete de Cabrita ao DN.

E à possibilidade aventada do Governo rever a sua política que impede a recolha de dados sobre minorias étnicas, a fonte oficial reiterou a hipótese “de estudar formas de aprofundar esta recolha de informação dentro dos limites admitidos pela Constituição da República”.


Via DN

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