(via www.ClicRBS.com.br) - Maicon Tenfen
Na semana passada, o Conselho Nacional de Educação aceitou uma acusação de racismo contra Caçadas de Pedrinho, um dos muitos livros que Monteiro Lobato escreveu para a série do Sítio do Picapau Amarelo. Se isso for adiante, é possível que a obra seja banida das bibliotecas públicas e escolares de todo o Brasil.
Mas, afinal de contas, Lobato era um escritor racista? Vamos supor que sim. Mas, nesse caso, já que a rancorosa patrulha do politicamente correto está desconsiderando o contexto histórico em que Caçadas de Pedrinho veio a público, é nosso dever exigir, como cidadãos brasileiros, que outras obras nocivas ao diálogo entre as etnias recebam o mesmo tratamento.
Para começar, devemos mandar os sonetos satíricos de Gregório de Matos para o limbo da nossa consciência histórica, especialmente aqueles que falam de “mulatos desavergonhados”. Para fazermos uma limpeza completa no século 17, precisamos acender um fósforo para vários sermões do Padre Antônio Vieira, que considerava a escravidão um mal necessário e aconselhava os negros (devo dizer afrodescendentes?) a carregarem sua cruz.
Por outro lado, a literatura brasileira do século 18 não peca por racismo, apenas por ingratidão. Enquanto os escravos eram chicoteados e obrigados a se enfiar em buracos minúsculos para catar ouro, Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga preferiam dedicar seus poemas às Glauras e às Marílias da vida.
Já a literatura do século 19 foi particularmente cruel com as etnias africanas. Por isso é justo que praticamente todo o Romantismo e boa parte do Realismo sejam condenados ao lado de Lobato. Quem ler os livros da época certamente há de se escandalizar com os pontapés que os protagonistas dispensavam a seus escravos.
— Mas… e A Escrava Isaura? — perguntam os crentes da bondade humana.
— Essa não vale — respondo com sarcasmo. — Isaura era uma “escrava branca” e, pela lógica perversa do romance, vai empalidecendo à medida que se aproxima da liberdade!
Exemplos mais recentes? Essa Negra Fulô, de Jorge de Lima, poema que conta a história de uma mucama cleptomaníaca (para usar uma expressão livre de preconceitos), ou toda a obra de Jorge Amado, que, visto como um defensor dos negros, na verdade é um racista jocoso, pois considera as mulatas predispostas à atividade sexual.
Entenderam o drama? Se começarmos censurando Lobato, seremos obrigados a banir a literatura dos currículos escolares. “Um país se faz com homens e livros”. Alguém aí se lembra do sujeito que disse uma barbaridade dessas?
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