segunda-feira, 16 de setembro de 2013

"Morar fora é conhecer a dor e a delícia de se adaptar ao paladar estrangeiro. A vida com novos aromas é fabulosa, mas fica a saudade da comidinha de casa". Rafaela Carrijo


Paladar estrangeiro e comidinha de casa
Paladar estrangeiro e comidinha de casa. / Foto: Thinkstock
Por RAFAELA CARRIJO


Amante imperdoável da boa mesa, e vinda de uma família de glutões, as garfadas em apetitosos pratos sempre costuraram minhas descobertas e costumo associar os lugares aos seus temperos. A culinária é para mim um importante e delicioso patrimônio cultural de uma nação. Através dos hábitos alimentares das pessoas é possível identificar aspectos peculiares de uma região. A escolha dos condimentos e o modo de se cozinhar os alimentos refletem de uma forma saborosa a identidade de um povo e visitar uma pátria nova me deixa com água na boca!

Quem mora fora tem a oportunidade de experimentar receitas fabulosas. Conhecer o paladar estrangeiro é descobrir mistura de temperos inimagináveis. A Alemanha, por exemplo, me ganhou pela boca, mas, no início, o gosto azedo predominante na culinária me torcia o bico. Hoje amo a acidez da farta comida alemã, aqui aprendi a apreciar o vinagre, usado não só em saladas, mas em carnes e até numa espécie de feijoada. Só que viver longe do país, significa também sentir saudades do sabor de casa, do gosto incomparável da comida da mamãe, do jantar preparado pela avó, ou pela tia ou dos momentos de gula entre amigos numa brasileira churrascaria.

Me delicio experimentando novos sabores, pois aprecio o gosto exótico de novas culturas. Viver longe de casa me fez criar um intercâmbio de receitas entre nações. Assim como eu incluí a pimenta, o açafrão e o dendê no cardápio alemão, as teuto especiarias alimentam minha vida. A Alemanha é "um prato cheio" para quem gosta de lambuzar os beiços. Quem não tem em mente a imagem de um robusto alemão devorando, feito primata, um pedaço de joelho de porco agarrado ao osso maciço? Meu irmão mais velho diz que na Alemanha se come comida de macho, própria para lenhador. O meu irmão caçula, que já encheu a pança por aqui, comprovou o fato e comportou-se como um autêntico alemão, roendo um joelho de porco (Eisbein) até os ossos. Só faltou a calça de couro com suspensórios.
Eu também tenho lá meus dotes culinários, herdados de uma família de mulheres talentosíssimas na cozinha. Verdadeiras magas do fogão, mamãe, vovó, bisavó e titia são minha inspiração na arte de cozinhar. Nesta troca de culturas, graças à panela de pressão que ganhei de presente da minha mãe e seu querido marido, e uma porção generosa de receitas, pude apresentar a comida brasileira aos meus amigos europeus. No meu caldeirão de delícias já preparei carne de porco, galinha caipira, feijão, sopas, tudo à moda mineira e goiana da mamãe.
Com empenho, tento me tornar uma mestre cuca alemã, para isso imitei minha sogra que foi ótima cozinheira. Cozinho com primazia um prato típico da região, o ensopado de lentilhas (Linsen Eintopf), parecido com nossa feijoada. Quando recebo visitas do Brasil, é este prato que coloco na mesa. Meu pai quando me visitou, raspou a panela e garantiu que a minha comida alemã havia sido a melhor que ele experimentou na passagem pelo país.

Meu marido alemão, através da boca, conheceu a mistura do Brasil. Degustou a comida mineira da mamãe Rô, moquecas da Bahia, pratos gaúchos, e descobriu que vários homens brasileiros são bons na cozinha. Como não citar as massas italianas do Vero e os pratos do Branco Leone, cheios de linguiças e guarnições portuguesas.
Nem todo mundo precisa saber cozinhar, cada um tem uma aptidão. Agora uma coisa é comum às pessoas de todos os países, todos gostam de comer bem e usar as refeições como confraternização. Por isso, gulosos por vocação, se rendam ao pecado da gula. E nem precisa viajar para experimentar a culinária do mundo, os sites de receitas estão cheios de pratos de outros países. Preparei um cardápio para quem quiser saborear pratos feitos por cozinheiros de mão cheia ou receitas que deixaram alguns bons de garfo, com água na boca.
* Rafaela Carrijo é uma contadora e ouvinte de histórias. Brasileira com orgulho e andarilha por destino, adotou a Alemanha como pátria por paixão. Como repórter, a encanta ouvir os entrevistados e investigar a realidade para transformar fatos em notícias. Como narradora, a inspira contemplar detalhadamente o mundo para estampar nos seus textos preciosidades de suas andanças. Fascinada por descobertas, a escrita é sua ferramenta para alimentar pessoas com sonhos e um punhado de narrativas.
Fonte: Tempo de mulher
(http://rafaelacarrijojeckle.blogspot.de/)

Nenhum comentário:

AS MAIS ACESSADAS

Da onde estão acessando a Maria Preta