quinta-feira, 6 de março de 2014

Ator e negro: Se não tivesse passado pela Globo ainda estaria na cadeia

Por Adelson Silva de Brito


O juíz da 33ª Vara Criminal do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) concedeu na tarde desta terça-feira (25/2), liberdade provisória ao ator e vendedor Vinícius Romão. Ele estava sob custódia policial há 16 dias, desde que foi “preso em flagrante” e acusado de “supostamente ter roubado e agredido” Dalva Maria da Costa Dantas no Méier, zona norte carioca. O caso foi registrado na 25ª DP, no Engenho Novo. A defesa alega que ele foi confundido com o ladrão e apenas estava passando pelo local .Amigos do ator que protestaram contra sua condenação afirmam que Vinícius foi vítima de racismo. Ele trabalhou na novela "Lado a Lado", da Rede Globo. A expedição do alvará de soltura foi “condicionada à assinatura de um termo de compromisso para que o indiciado compareça mensalmente em juízo a fim de informar e justificar suas atividades, além de não poder ausentar-se da comarca sem prévia autorização do juízo” (Última Instancia, 26 de fevereiro de 14). A ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, criticou hoje (27) a prisão do ator Vinícius Romão de Souza, erroneamente acusado de ter roubado uma pessoa. Para ela, as instituições públicas envolvidas no caso mostraram prática racista

Quer dizer, o acusado ainda continua respondendo a um processo suspeita. No dito popular, a tradução dessa situação seria: “Ô ‘pretinho’... tão limpando a tua barra aí, mas a gente ainda não tem certeza se tu és o não é, enquanto isso, tu fica esperto, viu?...”. Ou seja, o estado brasileiro, caracterizado pelo estado de coisas no Brasil, e melhor caracterizado ainda por essa atitude de fachada que não assume os erros que comete, particularmente quando o racismo institucionalizado nesse país, escancara o seu cinismo. Essa atitude obscura assumida pelo Juízo do estado do Rio de Janeiro delineia de forma estanque o sítio no qual se encontra o cidadão brasileiro sem acesso a educação que o liberta em nome da continuidade de um estado que o desserve em tudo, pois toma com base a sua ignorância com relação ao valor do imposto que paga. Aliás, o Brasil é o único país no meu conhecimento, no qual o cidadão comum se concebe distante da política. E o resultado dessa postura é este que vemos no nosso dia a dia.

Irmano-me (ou me sinto paternal, visto que é mais novo que a mais nova das minhas duas filhas) com o Vinicius ao vê-lo na sua postura mansa e distante da configuração de revolta de uma pessoa que foi vítima do racismo institucionalizado pelas instituições que forma a opinião do brasileiro dentre as quais a mídia é o carro chefe. Fui educado para ser mais um Vinicius, até que no meio do caminho, graças a minha busca individual por uma visão diferente, topei com a história dos nossos irmãos e irmãs afros descendentes nos Estados Unidos da América, e rompi aos quatorze anos de idade com o pacto de comodato que a sociedade brasileira me impunha como modelo de educação para o afro descendente: ser o “escurinho”. Rompi com esse pacto escravista ao contato com nossos irmãos e irmãs na Grande Diáspora Africana. Quem conhece Aimé Césaire, da Martinica, Léopold Sédar Senghor que foi o primeiro presidente do Senegal, pais que já foi a região onde se localizavam dois dos maiores impérios negro, o Mandinga e o Uolof, não tem o direito de manter e sustentar esse pacto espúrio que prolonga a sua escravidão. Quem conhece Frederick Douglass, Booker T. Washington, W.E.B. De Bois, Patrick Lumumba, Jomo Keniata, Keneth Kaunda, MARTIN Luther King Jr., Amilcar Cabral, Agostinho Neto. Quem conhece a Nzinga Mbandi Ngola, a rainha Ginga, que dá hoje nome a uma Avenida de Luanda, mulher negra indomável e inteligente soberana do povo Ginga dos reinos de Matamba e Angola, quem conhece através da educação as histórias desses líderes, nos quais vamos incluir exemplos mais próximos da nossa época, como Nelson Mandela, e Abdias do Nascimento,não levaria no sapatinho um episódio como esses.

Só para concluir, recordo a volta da minha primeira viagem ao Japão em 1991. Houve uma briga entre duas moças durante o vôo, e ao chegar ao Aeroporto do Galeão, agentes da Polícia Federal entraram na aeronave para conduzi-las quando um dos agentes olhou para mim e disse: “o moreno ali também vai...”. E eu pedi a ele que caracterizasse o crime que eu estaria cometendo em ser “moreno”, usando a terminologia eleita PR ele. O desfecho: Ele conduziu as moças e desistiu de acusar formalmente o “moreno”. Esse é o Brasil no qual pagamos a maior carga tributária do mundo.


Via Correio Nagô

Nenhum comentário:

AS MAIS ACESSADAS

Da onde estão acessando a Maria Preta