segunda-feira, 20 de outubro de 2014

MENINAS, MENINOS, EU VI

Aninha Franco em Trilhas, Correio da Bahia, 18.10.2014

Eu vi Lula perder a Presidência para Collor quando votei pela primeira vez pra presidente da República, em 1989, aos 38 anos. Lula amarelou no debate da Globo quando Collor, o canalha número dois do PT da época, insinuou que Lula comprou um aparelho de som que ele, Collor, nunca conseguiria comprar. E expôs um aborto que Lula pressionou a namorada a fazer. E o nosso herói operário desmontou como um pássaro atingido em voo para consternação de milhares de nós. Em dois anos, Collor caiu numa queda espetacular, combinados o seriado Anjos Rebeldes na TV e os caras pintadas nas ruas, liderados por Lindbergh, hoje acusado de envolvimento com a corrupção.

Nós, os que sobrevivemos à ditadura de 1964 a 1989, apavorámos com a possibilidade de outro golpe militar, mas Itamar Franco, o vice de Collor, tomou posse com seu inesquecível pimpão, e o Brasil caminhou para fora da ditadura que Sarney preservou até 1989. Em 1987, sob sua presidência, fui levada ao Dops pela segunda vez e, mais uma vez, indiciada, por desobediência civil porque exibi Je Vous Salue Marie no Espaço Bleff, o que me orgulha mais que o indiciamento por injúria às forças armadas em 1971. Meu advogado, Thomas Bacelar, e eu avisamos ao delegado que eu não negaria o delito da exibição, e que se fosse condenada não aceitaria o sursis e cumpriria a pena integralmente. Deu certo. O processo estacionou.

Itamar Franco, louco, marca da família, nomeou Fernando Henrique Cardoso ministro da Fazenda do governo, implantou o Real e, pela primeira vez na vida, aos 43 anos, eu tive uma moeda para chamar de minha. Delícia. Com Itamar, o Brasil voltou à vida republicana perdida em 1964 e as pesquisas indicavam que Lula venceria as eleições quando, no dia 12 de julho de 1994, FHC comemorou números expressivos em Santa Maria da Vitória, na Bahia, ao lado de ACM, que o apresentou ao povo como pai do real, enquanto Lula “descia de escorregador”. (Bahia Hoje, 11/ 7/1994). 

Quando a inflação de julho chegou em 7,67%, Lula e FHC empataram tecnicamente e, em setembro, FHC chegou a 40% subtraídos de Lula que caía sem parar. O real elegeu FHC no 1º turno, apesar dos votos nulos e da abstenção assustadora e, em 1998, a reeleição dobrou a gestão de FHC sob nossos protestos. Lula, o operário, chegou a Brasília em 2002 com o discurso da alternância de poder, a que provoca mudanças, a que julga gestões, a que impulsiona sociedades. E, poucas vezes, participei de uma festa tão vibrante como a da vitória de Lula no Largo de Dinha, no Rio Vermelho. O discurso de posse exprimiu o que nós, brasileiros desejosos de um Brasil mais justo, quisemos ouvir desde sempre.

Quando veio o Mensalão, em 2005, e implodiu a fantasia de que um operário combateria a corrupção e demoliria o poder imperial que ainda impera e impede o país, quando assistimos o operário juntar-se aos velhos oligarcas que detêm o poder não para melhorar a sociedade, mas para enriquecer e enriquecer seus companheiros, só nos restou uma possibilidade: a alternância de poder, apenas ela, aquela que definiu meu voto e meu apoio nas eleições de 2014.


Fonte: Correio 24 Horas

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