sexta-feira, 14 de novembro de 2014

O jogo da campanha e a realidade da política

Por Felipe Schulman

A rapidez na mudança de idéias (e pensamentos) é estrondosa. E o fenômeno não é restrito ao PT.

A presidente Dilma Rousseff e o governador 
de São Paulo, Geraldo Alckmin 
(Imagem: Antonio Cruz / ABr)
Dilma foi reeleita há quase três semanas. Desde então, entre outras coisas, já houve aumento na taxa de juros, reajuste no preço da gasolina e da energia, além da apresentação de um plano partidário defendendo a infame “regulação econômica da mídia”.

Sobre a taxa de juros a mesma Dilma dizia, em campanha, que aumentos aplicados pelo PSDB no governo FHC eram desnecessários e em benefício dos ricos, principalmente dos banqueiros. Disse também que a inflação estava sob controle. Agora, depois das eleições, o aumento se faz necessário e visa ajudar a todos os brasileiros.

Em resumo: antes, Dilma negava a necessidade de reajustes. Em duas semanas sua opinião mudou. Aliás, durante a campanha, ela se dizia contra qualquer tipo de regulação na imprensa; agora a defende com “diálogo”.

A rapidez na mudança de idéias (e pensamentos) é estrondosa. E o fenômeno não é restrito ao PT: o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, por exemplo, que negava a existência de uma crise hídrica no Estado durante as eleições, pediu, em encontro com a presidente, R$ 3,5 bi para combater a “crise inexistente”.

Promessas em vão e mentiras dirigidas a públicos específicos em campanha não são invenção brasileira. Li, essa semana, um artigo de José Pereira Coutinho na Folha de S. Paulo que falava sobre o primeiro guia de campanha eleitoral do mundo. Trata-se de um pequeno livro escrito em 64 A.C intitulado, em tradução livre para o português, “Como vencer uma eleição”.

No livro, o autor romano Quintus Cícero descreve o que deveria ser feito em campanha. A parte que trata de convencer os indecisos se resume ao simples ato de prometer: quem promete mais, segundo Quintus, sairá vencedor e, já no poder, não precisará cumprir suas promessas. Se este mesmo guia fosse publicado hoje suas estratégias pareceriam óbvias e repetitivas.

Em meio a tudo isso estamos nós, os eleitores, cansados da overdose político-partidária das eleições e, ao mesmo tempo, aflitos para vigiar ações do governo e da oposição. Não sabia que seria tão difícil conseguir vistoriar as ações de Dilma e Aécio depois que a campanha acabasse.

A informação, depois de apenas três semanas das eleições, já começa a ficar escassa, especialmente quando que se trata da oposição.

Na primeira semana após as eleições havia matérias e entrevistas afirmativas com o candidato derrotado em todos os veículos de informação. Agora, o tucano não sai de cima da árvore.

A oposição forte prometida por Aécio no Senado pode até já estar acontecendo nos bastidores da casa, mas é quase impossível de ser encontrada pelo cidadão comum.

Se é que há alguma lição que poderíamos tirar dessa história turbulenta e problemática, seria uma revisão de nossa abordagem em relação à propaganda eleitoral e aos debates.

Mais do que a exposição de projetos e propostas, a campanha serve para informar o eleitor sobre o que aconteceu nos últimos quatro anos e não pudemos ver.

Torço para que, já neste mandato, haja uma mudança de estratégia por parte dos partidos com o objetivo de promover, por meio das redes sociais, por exemplo, um maior engajamento com o eleitor em tempos não eleitorais.

Talvez assim, nós, eleitores possamos ter condições de lembrar, daqui a quatro anos, das peripécias protagonizadas por Alckmin e Dilma no período pós-campanha que vivemos hoje. E não só por elas, é claro.

Fonte: O Globo

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