A convite de CLAUDIA, Camila escreveu um delicado manifesto sobre a causa feminina no Brasil. Leia:
“Nosso tempo é agora”
Quando fiz 9 anos, meus pais se separaram. Fugindo à tradição, fui morar com meu pai. Nosso ‘pãe’ desdobrou-se em trabalhar e cuidar da gente: meu irmão e eu. Ele não se intimidou em assumir as chamadas funções femininas: passava minha saia de pregas com uma destreza impressionante, cozinhava o melhor mingau de todos os tempos. Quando menstruei, me mandou flores. É desse lugar de delicadeza e possibilidades mais amplas de ser humano que estabeleci a minha visão sobre o mundo. Um lugar de liberdade. Um lugar de amor, respeito e de cuidado mútuo.
Quando penso em empoderamento feminino, me pergunto quais mudanças nós, mulheres e homens, precisamos fazer para que a igualdade vire normalidade: permitir que mulheres decidam sobre a própria vida, que homens dividam cuidados familiares e sejam solidários com as mulheres na garantia de direitos.
Empoderamento é a consciência sobre o que somos, como vivemos e o que queremos.Isso é possível com mergulhos em nós mesmas, livres de todas imposições de comportamentos alheios às nossas vontades.
O empoderamento das mulheres, assim mesmo no plural, tem nos levado a novos lugares e nos fortalecido, umas às outras, em marchas e até em blocos de Carnaval. Na internet, mulheres transformaram sites, blogs e redes sociais em espaços seguros para afirmar identidades. Nesses espaços seguros, as discussões sobre nossa vida se tornaram públicas e revelaram opressões e violências em relações afetivas e íntimas. Ajudaram a criar consciência coletiva, formar alianças e amplificar vozes. O que falta para virar a chave?
A grande virada a favor da igualdade de gênero precisa de velocidade em ações concretas, com foco nos direitos das mulheres. Precisamos canalizar essa energia criativa que nos anima e nos une. Precisamos aumentar a representatividade política, ocupar mais e melhores espaços na comunicação, valorizar empresas com equidade salarial, garantir saúde, direitos sexuais e reprodutivos, obter o respeito a territórios, reconhecer a diversidade das brasileiras como elemento positivo de um país que precisa eliminar desigualdades. Disso tudo depende a nossa dignidade. Disso tudo depende o fim de sacrifícios de gerações de mulheres.
Quem é você que lê este texto? Já viveu algum tipo de violência? Teve dificuldade em ascender na profissão? Tem tempo para si mesma? Essas são algumas das perguntas que precisamos fazer a nós e a quem está à nossa volta. É tempo de despertar nossos sonhos, desejos. Enfrentar nossas dores e curá-las.
Temos pressa. Afinal, estão em jogo os melhores anos de nossa vida. Em tom de urgência, é preciso gerar pressão para assegurar a igualdade entre mulheres e homens como condição nas relações humanas. Significa não tolerar agressões de quem quer que seja e convocar os homens para que assumam o seu papel e a sua responsabilidade para enfrentar o machismo e as desigualdades. Nós, mulheres, somos parte na construção de soluções políticas. E temos a chance de mudar e de viver essa realidade se forem dados passos decisivos, todos os dias, pela igualdade de gênero.
Comecei escrevendo sobre meu pai porque ele foi minha primeira referência masculina. Ele, com seu amor e respeito pelas mulheres, me deu passaporte para amar a mim mesma, aos homens e às mulheres. Evoé!
Por Isabella D’ercole, do HUFFPOST
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