Khristina Viana
Jornalista e educomunicadora
Foto: Internet |
Você já deve ter passado por eles ou elas várias vezes ao dia. Estão nas ruas, no trabalho, em
casa, nos bares e restaurantes e, em todos os lugares que freqüentamos.
São os “vestidos de invisíveis”. Trabalhadores que usam uniformes e por isso, são
discriminados.
Você pode encontrá-los sem uniformes e até conversar com eles. Mas, quando eles se
vestem de invisíveis, ou seja, com a capa da invisibilidade, as vestes indentitários; nós nãos os
reconhecemos.
A novela das oito Fina Estampa a protagonista Griselda Pereira interpreta por Lilian Cabral e
um exemplo disso. Trabalhadores como outro qualquer, apenas por um senão.
Tornam-se
pessoas invisíveis para nós porque os uniformes que usam os rebaixam socialmente. De uma
forma negativa, que os igualam de forma discriminada. Numa escala menos zero.
Refiro aos trabalhadores da limpeza de rua, coletores de lixo, da limpeza do escritório, do
trânsito, garçom, do posto de gasolina, doa caixa do supermercado, da padaria, copeira, etc.
Sim, não é apenas o uniforme que fazem com que se tornem invisíveis na nossa vida cotidiana.
Afinal outros profissionais como médicos, bombeiros, policiais, juízes, padres, só para citar
alguns, também usam uniformes e são respeitados e até reverenciados em nossa sociedade.
Então, porque não tratamos da mesma forma esses trabalhadores. Hierarquia trabalhista ou
classismo?
Esta é minha indagação que compartilho com você.
O psicólogo social Fernando Braga da Costa vestiu uniforme e trabalhou oito anos como
gari, varrendo ruas da Universidade de São Paulo. Ali, constatou que, ao olhar da maioria, os
trabalhadores braçais são 'seres invisíveis, sem nome'. Em sua tese de mestrado, pela USP,
conseguiu comprovar a existência da 'invisibilidade pública', ou seja, uma percepção humana
totalmente prejudicada e condicionada à divisão social do trabalho, onde enxerga-se somente
a função e não a pessoa.*
“É como se a roupa fosse mágica e transforma-os em Nada.” diz
Você por acaso dar bom dia, cumprimenta com educação esses trabalhadores que lhe servem
todos os dias É claro que não! Desde pequeno, praticamos essa invisibilidade. E isso é uma
questão de educação doméstica, pois nos não somos orientados a cumprimentar esses
trabalhadores.
Nossas mães, pais e educadores mesmo que eles também usem uniformes, também não dão
exemplos de comportamento social adequado para com estas pessoas que usam uniformes no
trabalho.
Em baixo daquele “vestir”- seja por higiene ou não, estar ali uma pessoa, um trabalhador, que
contribui para o crescimento da Nação.
E como dizia meu falecido pai porteiro de repartição publica que presenciou por diversas vezes
essa distinção:
“A gente, pobre ou rico, vive da aparência. Por exemplo, se bate na sua casa e você vai olhar
a primeira coisa que a gente faz é reparar o que veste o cidadão - principalmente nos pés. Se
vier descalço você nem abre a porta. É alguém pedindo, deduz; se estiver de sandália você
abre a porta e atende se estiver de sapato você abre e manda entrar e por fim se vier de carro,
você vai até o carro!”
A aparência e a discriminação andam de mãos dadas. É regra social, cultural...
A verdade é
que em pleno século 21 onde discutimos metas de milênio e o combate a discriminação de
todas “as tribos” vale o debate sobre os vestidos de “invisíveis”.
Praticamos iniqüidade quando ignoramos esses trabalhadores. Ou em puro português estamos
desrespeitando um trabalhador na sociedade, por pura discriminação institucionalizada,
enraizada em nossa cultura há muito tempo.
Não estamos nos referindo, a questão racial, gênero, orientação sexual, ou os típicos de
discriminação ou preconceito que lidamos diariamente. Até mesmo aqueles que levantam
a bandeira contra a discriminação realizam, na maioria das vezes, automaticamente, por
osmose, este tipo de iniqüidade.
Mas, sim de uma discriminação classista. Sim. Classismo com C maiúsculo. Essas pessoas estão
em nosso dia-a-dia e a e a verdade é que procuramos ignorá-la, não sendo equi com elas!
Ser IGNORADO é uma das piores sensações que existem na vida!”*
Não precisamos ser amigos dos trabalhadores que usam uniformes. Mas temos a obrigação
de respeitar esses trabalhadores como pessoas que são, assim como respeitamos os outros
trabalhadores com ou sem uniformes.
”Descobri que um simples bom dia, que nunca recebi como gari, pode significar um sopro de
vida, um sinal da própria existência... Professores que me abraçavam nos corredores da USP.
Passavam por mim, não me reconheciam por causa do uniforme. Às vezes, esbarravam no meu
ombro e, sem ao menos pedir desculpas, seguiam me ignorando, como se tivessem encostado-
se a um poste, ou em um orelhão “*
Pensem nisso na próxima vez que ver um trabalhador de uniforme na rua, na escola, no posto
de gasolina, no supermercado, no restaurante, em casa...!
Quero acreditar que o uso do uniforme não se torne uma capa de invisibilidade, mas sim uma
maneira pratica higiênica e econômica para que esses trabalhadores, sejam eles médicos ou
limpadores de rua, exerçam um bom desempenho sua função.
**. Entrevista concedida ao Diário de São Paulo out 2008 sobre a Tese de Mestrado em
Psicologia Social – USP ¹ HOMEM TORNA-SE TUDO OU NADA, CONFORME A EDUCAÇÃO QUE
RECEBE'
Khristina Viana é jornalista, educomunicadora e membro Coletivo de Jornalistas pela Igualdade
Racial - CONJRA-BA
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