terça-feira, 5 de junho de 2012

Europa - Associação ensina seguranças a combater racismo durante a Euro

Diretor de organização polonesa afirma que perigo maior com os hooligans não estará dentro dos estádios, mas sim em áreas de grande concentração
Por Rafael MaranhãoDireto de Varsóvia
A equipe comandada pelo polonês Jacek Purski não vai entrar em campo, mas dela depende muito do sucesso da Eurocopa. Seis meses depois de Polônia e Ucrânia serem escolhidas as sedes da Euro 2012, Purski começou a trabalhar para combater a principal preocupação da organização do torneio: o racismo. À frente da associação "Nigdy Wiecej" ("Nunca Mais", em polonês), ele dá palestras e treinamento a grupos que vão desde políticos a voluntários e seguranças que trabalharão na Eurocopa, para que possam identificar e conter grupos que queiram usar o evento para manifestar seu preconceito.
- Quando nos reunimos pela primeira vez, ouvi da Uefa que estádios, aeroportos e estradas eram muito importantes, mas eles sabiam que isso seria resolvido. O temor era justamente as manifestações racistas, atitudes infelizmente enraizadas no comportamento dos hooligans poloneses e de outras regiões do Leste Europeu - afirmou Jacek Purski, em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM na capital polonesa Varsóvia.
Jacek Purski, diretor da "Nigdy Wiecej", mostra cartaz
contra racismo (Rafael Maranhão / Globoesporte.com)
Racismo não é exclusividade das arquibancadas polonesas e ucranianas. O crescimento dos movimentos de extrema direita, de discurso xenófobo, é um fenômeno que atinge quase todos os países da Europa, sobretudo em tempos de grave crise econômica, e que em muitos deles têm ligação direta com torcidas organizadas. Mas foi somente com a Euro 2012 que medidas mais concretas para combater o preconceito nos estádios de futebol passaram a ser tomadas nos países-sede.
- O futebol é a arena perfeita para espalhar suas ideias. Ali existe uma identidade em comum, um sentimento de "nós" contra "eles". Na Polônia, durante o regime comunista, os estádios eram os únicos locais onde as pessoas podiam se manifestar. Talvez por isso, até cinco anos atrás as pessoas não enxergavam o problema. Nós avançamos muito, mas ainda há um longo trabalho a ser feito. Principalmente na Ucrânia, onde começamos essa iniciativa há somente três anos - disse Jacek.

No passado, o problema atingiu até um jogador brasileiro, o meia Roger Guerreiro, que naturalizou-se polonês e defendeu a seleção local na Eurocopa de 2008.

- Roger era muitas vezes recebido com gritos e faixas com a mensagem "você nunca será um polonês". Mas essa é uma minoria. A grande parte tem uma curiosidade em relação aos estrangeiros, que ainda são relativamente poucos em comparação a outros países. Roger é querido pelos poloneses. A situação foi mais complicada antes, para Emmanuel Olisadebe, nascido na Nigéria e primeiro estrangeiro a defender a seleção polonesa - lembrou Purski.

- Nossas campanhas e panfletos são nada perto do que representou quando Olisadebe fez dois gols em sua primeira partida oficial, em 2000, e a Polônia ganhou o jogo.

Jacek Purski não acredita que as manifestações nos estádios se repitam durante a Euro. As medidas de segurança, o cadastro dos torcedores, os postos de controle para que apenas pessoas com ingressos se aproximem das arenas e o preço das entradas devem afugentar os hooligans. Segundo Jacek Purski, os visitantes devem estar atentos a locais de grande aglomeração, como as "Fan Zones", áreas gratuitas onde as partidas são exibidas em telões.
Brasileiro Roger Guerreiro já sofreu com o racismo
da torcida polonesa (Foto: Getty Images)
- Esses grupos gostam de aparecer. Acho muito difícil que percam a oportunidade de se manifestar com tantos torcedores e jornalistas estrangeiros presentes. Mas não durante as partidas, e sim nos arredores.
'Zonas inclusivas' para os visitantes
Em parceria com a Uefa e com a rede Fame ("Futebol contra o Racismo na Europa", na sigla em inglês), a associação "Nigdy Wiecej" criou as chamadas "zonas inclusivas". São locais nas cidades-sede marcados por pôsteres e adesivos que ajudarão o visitante a saber de que se trata de uma área onde todos são bem vindos independentemente de origem, religião ou orientação sexual.
Durante a Eurocopa, também serão organizados torneios de futebol inspirados numa iniciativa da associação polonesa, a Etno Liga. São jogos entre equipes formadas por pessoas de diferentes origens, para que se conheçam melhor e derrubem preconceitos em relação aos estrangeiros. Além disso, a "Nigdy Wiecej" dará continuidade ao trabalho de informação sobre símbolos associados a grupos neo-nazistas e de extrema direita, o mesmo que é feito com os seguranças e voluntários que trabalharão na Eurocopa.
Após a queda do comunismo, o povo polonês teve dificuldade para se associar com a Europa. Essa é uma parte desse processo."
Jacek Purski
- É preciso que eles saibam identificar que ali se trata de uma palavra ou uma imagem com conotação racista, para que possam se antecipar ao problema. Mas também é importante que eles entendam o porquê disso. A maioria nunca recebeu nenhuma explicação sobre o que os símbolos nazistas representam, por exemplo - afirmou.
Fã de futebol, Jacek Purski diz que a Eurocopa representa muito para o seu país mas não acredita no sucesso da seleção polonesa nos gramados. O que ele espera é que o país deixe uma boa imagem ao menos fora de campo.
- Eu brinco que nós não vamos nem passar de fase, não vamos conseguir terminar as obras a tempo, mas temos que ser os melhores anfitriões. Essa é uma chance única. Não vamos ter outra Eurocopa aqui durante nossas vidas. Após a queda do comunismo, o povo polonês teve dificuldade para se encontrar e se associar com a Europa. Essa é uma parte desse processo. Queremos que as pessoas percebam a importância desse momento - completou.

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